segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Voo 3244 FUGINDO Á CARÊNCIA HABITUAL...







Giselda Pessoa
2ºSargº.Enfª. Paraqª.
Lisboa


FARTOTE DE LEGUMES

Quando deambulava pelos aquartelamentos espalhados pela Guiné, nas minhas missões, tive oportunidade de verificar as condições difíceis em que viviam muitos dos nossos militares, nomeadamente no que dizia respeito à alimentação.

Na verdade, devido às dificuldades de abastecimento de géneros, mais visíveis nos aquartelamentos mais isolados, a alimentação falhava com bastante frequência, quer na quantidade quer na qualidade.

Assim, o "prato do dia" em muitos sítios era sistematicamente repetido, geralmente com base no arroz ou massas e enlatados e algum produto produzido localmente, mas muitas vezes com visível falta de frescos para acompanhar a refeição.

Tive a oportunidade de verificar isso pessoalmente em diversos locais onde, por força do apoio a operações, permanecia durante todo o dia, juntamente com as tripulações de alerta às evacuações.

Lembro-me que, em determinada altura, devido ao sistema de rotação com as minhas colegas, dia sim dia não "abancava" no aquartelamento de Cufar onde, sistematicamente, ao almoço nos era servido esparguete com ovo estrelado, salsichas e mortadela (das enlatadas). Poder-se-ia dizer que não era tão mau como isso, mas não se pode considerar adequada uma alimentação que, por ser repetitiva, se tornava enjoativa, acrescida da falta de frescos para equilibrar a ementa.

Outra situação particular vivi-a num aquartelamento no norte da Guiné que apenas dispunha de um heliporto improvisado; após a nossa aterragem, logo pela manhã, muito amavelmente perguntaram-nos se queríamos beber alguma coisa. Para evitar penalizá-los pedi-lhes um simples copo de água. Disseram-me que água não tinham no momento, que tinham que a ir buscar longe. Só se fosse whisky ou Martini...

Pelo contrário, outro local em que muitas vezes permanecíamos, no sul, dispunha de bastante água, não costumando ali faltar os frescos. No decorrer de uma operação em que ali parámos um par de horas, numa visita às hortas que ali havia tive a oportunidade de gabar ao seu responsável a qualidade dos legumes ali produzidos.
No momento em que nos preparávamos para descolar tive a surpresa de ver o tal responsável pelas hortas dirigir-se-me, trazendo-me simpaticamente dois sacos volumosos, um com alfaces, outro com couves. Embora com os meus protestos, pois eles precisariam mais daqueles frescos do que eu, acabei por embarcar o material que tão generosamente nos tinha sido oferecido.

O nosso destino era Guileje, onde tive igualmente a oportunidade de passar bastantes dias de alerta. Pela experiência anterior, sabia das limitações de Guileje no que dizia respeito à água e aos frescos, pelo que, lá chegados, foi com satisfação que ofereci os sacos com os legumes que tinha trazido comigo. E o facto é que de imediato alguém tratou de dar destino àquele "petisco" caído do céu. E ao almoço, que partilharam com a tripulação, foi possível distribuir, por um dia, um "rancho melhorado" a quem, devido às carências existentes, há já uns tempos que não metia o dente nuns legumes tão frescos e tão apetitosos.
                                                    
Giselda Pessoa
Nota: A foto 1 foi cedida pelo Gil Moutinho, na foto (os nossos agradecimentos). As fotos 2, 3 e 4 aqui reproduzidas destinam-se essencialmente a enquadrar o texto, não estando directamente relacionadas com os eventos descritos. Reproduzidas de "Luís  Graça & Camaradas da  Guiné", com a devida vénia.



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