quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Voo 2731 O GRANDE APOIO QUE A FORÇA AÉREA NOS DAVA.




Rui Ferreira

Cap.Mil.Exercº

Viseu






"Meu Caro Victor Barata.
É certamente com toda a honra e com imenso prazer que faço esta primeira visita ao vosso blogue.
Tanto para ti como para ele blogue vos desejo uma longa e frutuosa vida.
Que a sorte com que os Deuses distinguem os eleitos, e só estes por razões que não te consigo explicar porque as desconheço, faça cair sobre ti a magnitude que a tua grandeza de alma é merecedora todas as bênçãos do mundo. Para me não alongar em demasia vou transcrever, se me deres licença, o que pensava e continuo a pensar sobre a nossa Força Aérea que nos protegeu na Guiné.
Do meu livro de Memórias "Rumo a Fulacunda",a página 253 e seguintes,pode ler-se:

Por falar em sensação de segurança, convém não deixar passar a ocasião para publicamente expressar o sentimento da maior gratidão à actuação da Força Aérea.
Mesmo considerando que apesar das circunstâncias serem muito próprias a cada ramo das Forças Armadas,das suas formas de actuação serem bem diversas, de ter arcado o Exército com a parte mais difícil do conjunto, a menos espectacular mas a de maior sacrifício, a actuação da Força Aérea foi duma extrema utilidade, não se esquivando os pilotos de poisar nos mais problemáticos e inseguros locais, iam cometendo por vezes verdadeiros milagres, arriscando as suas próprias vidas na tentativa de salvar outras pelo que transmitiam a segurança e davam a confiança a quem se batia no terreno nas mais duras e adversas condições. As evacuações eram rápidas e seguras e das duas vezes que fui ferido em menos de meia hora estava no Hospital de Bissau.
Se constituiu a evacuação nocturna do 1ºCabo Domingos Pereira um acontecimento extraordinário que por inédito e arrojado, face ás circunstâncias que então se viviam e ás possibilidades quer humanas quer do material com que foi levada a cabo, ainda hoje me emociono ao relembrar uma outra, igualmente nocturna, que foi efectuada por um capitão bem experimentado e tarimbado,Martinho ou Marcelino de a memória não me atraiçoa(por acaso foi atraiçoado pois o nome correcto era Moutinho)que pilotando um Dakota,foi a Aldeia Formosa arrancar a uma morte, mais que certa, de dezassete jovens da população civil.
Sucedeu que à tradicional maneira islâmica, segundo os rituais das tradições religiosas do fanado, foi um numeroso grupo de rapazes que então atingiu a puberdade, sujeito à circuncisão. Só que o dignitário religioso que a ele procedeu, em Março de 1972,ou porque era novato no assunto ou por quaisquer outros motivos que nunca chegaram a apurar,a executou de forma deficiente,e dentro de muitos que a ela foram sujeitos,cerca de duas dezenas, entrou em perda de sangue, com hemorragias que não conseguiriam estancar. Mas como eram assuntos completamente tabu,circunscritos,absolutamente reservados e preservados no interior da própria comunidade, sobretudo pelo carácter religioso de que se revestia só recorreram à tropa quando em desespero de causa os viram praticamente mortos.Já tinha anoitecido pelo que transportados para a enfermaria o médico garantia que ou os evacuávamos para onde pudessem ser sujeitos a várias transfusões de sangue ou não resistiriam e a maioria deles não chegaria com vida ao amanhecer do novo dia.
Posto o assunto para Bissau,após profundamente ponderado,foi decidido tentar,já que era a única forma de os salvar,levar a cabo a evacuação imediata que,logicamente,dado que a noite mal tinha começado teria de ser efectuada sem iluminação capaz. Mobilizado o pessoal num reforço conjunto,absolutamente desinteressado mas verdadeiramente digno pelo altruísmo e amor ao próximo, rapidamente de instalaram duas filas de garrafas de cerveja que alimentadas a petróleo,transformadas as gases da enfermaria em torcidas,serviram para iluminar e delimitar as bermas da pista,localizando-as e fornecendo ao piloto a noção da sua extensão bem como a distância a que se encontrava o solo.....
começou a ouvir o roncar do avião que se aproximava para logo de seguida o sentir sobrevoar a povoação,pelo que acesas as balizagens,após duas voltas de reconhecimento ou adaptação,nem sei lá bem,aterrar o Dakota com a suavidade que o faria como se em pleno dia estivéssemos. Espontaneamente, recebemos o Capitão Pilav com uma calorosa salva de palmas mal abriu a porta. Levantou com a mesma suavidade e do seu gesto de uma profunda humanidade se salvaram dezassete vidas na flor da idade.

E por aqui me fico que isto foi mais longo que eu queria
Um grande abraço fraterno de inter armas.
Rui Alexandrino Ferreira
Capitão Mil (à data) Comdt da CCaç.18 Aldeia Formosa


VB:Olá Rui.
De facto a nossa presença era muito sentida no seio do aquartelamento,pois logo que se soubesse da aproximação da DO 27,avião em que fiz parte da minha vida na Guiné,toda a malta se dirigia para a “pista” afim de procurar o tão desejado correio que lhe transmitiria as notícias dos familiares e amigos.
Pessoalmente cheguei a levar para distribuir,alguns maços de tabaco.
Era uma alegria quando encontrávamos companheiros de infância ou da nossa localidade metropolitana.