domingo, 30 de maio de 2010

VOO 1742 O EGÍDIO LOPES.




Fernando Moutinho
Cap.Pil. (Refº)
Alhandra




Boa noite Vítor
Não resisto a fazer-te um pedido.
Ao ler o Voo 1739 de José Osório com a mensagem de Egídio Lopes. Essa mensagem fez-me recordar uma aventura em que participou o Egídio.
Ele foi um dos pilotos duma aventura que descrevo :

Quatro F-86F em sérias dificuldades

Uma emergência que não devia acontecer Base Aérea 5, decorria o ano de 1965.
No prosseguimento do Programa de Treino dos pilotos, saí numa sexta feira a comandar uma esquadrilha de 4 F-86´s para Oldenburgo, uma Base da Força Aérea Alemã, a fim de retribuir uma visita efectuada a Monte Real, de pilotos dessa Base. Devido à distância, aterraríamos em Chateauroux (França) para reabastecimento de combustível e oxigénio, como era normal fazer-se. De rotina, antes de se chegar ao destino confirmávamos a meteorologia para se definir se prosseguiríamos para o destino ou se para outro aeródromo alternante prevendo problemas de combustível. Havia um local apropriado para o fazer – à vertical de Bordéus. Porque aí tínhamos várias alternativas. Voávamos com céu limpo e solo à vista. Confirmamos o tempo em Chateauroux: uma camada compacta de nuvens baixas com a base a 700 pés (200 e poucos metros) e tecto a 2.000 pés, vento calmo. Decidimos prosseguir porque os 4 pilotos estavam todos credenciados com mínimos de aterragem para 300 pés com assistência de GCA (Radar) e Chateaurox tinha-o. Como voávamos a 37.000 pés (pouco mais de 12.000 metros) iniciamos a descida em rota para atingirmos a ajuda rádio a 20.000 pés, de acordo com as regras. Como a descida era em parelhas, ao atingir-se a vertical da ajuda rádio (radiofarol), a parelha asa iniciou o procedimento de descida e a minha parelha efectuou a “espera” standard de 4 minutos para permitir o espaçamento normal. O Controle da Base informou-nos que à descida seguir-se-ia um “circuito caixa” porque aterraríamos na faixa oposta à da descida. Tudo normal. Quando a 1ª parelha estava na “perna base”, antes de voltar para a aproximação final, muda de frequência para efectivar a descida para a final. Nesta fase, as comunicações em canal apropriado ficam em exclusivo para os aviões até à aterragem. Sou surpreendido quando o piloto dessa parelha volta à frequência inicial e me pergunta se estamos ouvir. Respondo que sim. Ele replica que não obtém resposta. Digo-lhe para passar ao canal de emergência (243.0). Poucos segundos volta a informar que não obtém resposta e decide – como já está apontado à pista vai prosseguir a descida tentando sair das nuvens com possibilidades de aterrar. Assim fez mas ao entrar em visual a pista estava um pouco ao lado não permitindo a aterragem. Tiveram de efectuar uma volta junto ao solo mas aterraram. Continuava o silêncio rádio. Impensável – uma Base da USAF ficar sem comunicações. O próprio Radar tem sempre acoplado um sistema de gerador para as emergências. Nada funcionava. A situação da minha parelha ficou bastante insustentável: pouco combustível, dentro de nuvens e a voar em sentido contrário à descida “normal” para aterragem com o radioajuda. Rodei cerca de 180º e apontando ao radiofarol fui descendo lentamente pretendendo descer até ver o chão. Assim fizemos saindo um pouco acima das árvores. Continuamos até passar sobre a antena e aí tivemos de efectuar mais uma inversão de marcha para podermos apontar à pista (nesta volta foram gastos mais de 3 minutos). O problema nº 1 agora era o combustível. Voávamos com o avião o mais “limpo” possível e a baixa velocidade, mesmo contrariando as instruções: redes abertas e freios fechados. A ajuda rádio ficava a cerca de 7 Km da pista. Aí como estávamos a correr o risco de paragem do motor por falta de combustível disse ao meu “asa”: em caso de flame-out, fazer o zoom-up e saltar de paraquedas. A meio caminho entre o rádio farol e a pista, oiço: Bleu Falcon do hear me? Alivio: Affirmative. Comunicação seguinte: heading … e climb to… Minha resposta: heading … but dont climb – fuel emergency. Peço aproximação directa. “Roger” e continuaram a dar-nos pequenas correcções até aeródromo. Só iniciámos a descida do trem à vista da pista e os flaps, redes e freios já foi no solo. No estacionamento, verificámos que o meu asa tinha menos de 100 litros de combustível e eu ligeiramente mais. Não dava para dar uma volta ao aeródromo. Foi “in extremis”. Os outros 2 pilotos já aterrados esperavam-nos ansiosamente. Foram cerca de 20 minutos de espera angustiante. À nossa espera tínhamos também patentes elevadas apresentando desculpas pelo sucedido. Situação verdadeiramente inaceitável para a Base mais importante da USAF em França. Houve uma falha total de energia do fornecedor exterior mas, não podia ter acontecido o falhanço dos sistemas de emergência preparados para entrar em funcionamento em 2 minutos. Se seguíssemos as regras, teríamos, os 4 pilotos saltado de páraquedas. Mas, nós portugueses temos o defeito de quebrar algumas regras mas também uma virtude, não desistir e tentar. Após este episódio, resolvemos continuar a missão até Oldenburgo. Não valia a pena ficarmos a comentar o sucedido. No sábado de manhã já com combustível e oxigénio e arrancamos para o destino. À chegada, tínhamos à nossa espera um “comité de recepção” que nos levou directamente para o balcão do Bar e, aí com o estômago vazio sai cerveja com scnhaps. Foi o fim. Passamos o resto do dia a vomitar e a curar uma “piela” em que não estávamos interessados. O domingo foi para tentar recuperar… Segunda de manhã, arrancamos para Chateauroux novamente. Ao entrar no espaço aéreo francês o Control dá-nos as boas vindas e presta-se a levar-nos quase “ao colo” até ao destino. Não foi necessário seguir os procedimentos normais. Isto significa que a situação ocorrida foi muito anormal que toda agente se desfazia perante a nossa presença. Novamente me Chateauroux reabastecemos e fomos tratados nas palminhas e, soubemos que tinha sido destituído o comandante da Base. Foi uma ocorrência extremamente grave. Simplesmente, não poderia acontecer.

Egídio, onde quer que estejas, um grande abraço do Moutinho.
Obrigado Vítor
Um abraço